quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Carta à menina do mundo da saudade

Londres, 11 de Agosto de 1665

Oi, Guilhermina. Estou em uma das ruas de Londres levando algumas pessoas para morar junto ao cemitério sombrio, como você descreveu-o. A epidemia foi transmitida por uma bactéria da pulga dos ratos contaminados. E muita, mas muita gente mesmo, ficou espalhada pelas ruas da capital inglesa. Tenho até pena desses pobres coitados... Eu venho aqui na maior cara-de-pau e levo-os para descansarem em paz no começo de uma outra vida. Chegará o dia quem que você também passará por isso, menina inteligente.

Quero responder suas perguntas, mas vamos com calma, porque estou cheia de trabalhos a fazer. São muitos corpos pra dar conta aqui, Guilhermina. Segundo minhas amigas de trabalho, já tem quase 60.000 mortos! Fora os que estão do outro lado da cidade.

Aqui tá um verdadeiro caos. Portas de comércio fechadas, pessoas passando longe umas das outras. E nessa hora eu rio: elas não perdem por esperar. Que pena. Vou levá-las!

Querida, você nunca me fez nada de mal. Tirando essas perguntinhas chatas... “por que isso?”, “porque aquilo?”. Mas entendo seu lado questionador. Esse poeta que surge nos anos 2000 tá certíssimo quanto ao verso que você citou. É o que a maioria dos grandes pensadores, assim como você, faz. Enxergam além de tudo pra ver se eu existo, como sou, para onde levo as pessoas... Não tenha medo, Gui – vou lhe chamar assim.

Quanto àquela menina dos livros, ela é uma pirralhinha bem legal, sabe?! Ela realmente viveu intensamente os anos de guerra. “Tinha” um amigo judeu no porão de sua casa. Teve um grande amiguinho que morreu em meio à guerra. Ah, infelizmente levei comigo seu irmãozinho de oito anos. E como, como ela roubou livros!! Essa história não será mais bela se eu ficar aqui contando-a para você, Gui. Quando você for vovózinha, terás a oportunidade de ler o tal livro.

Desculpe ser tão direta contigo, mas é que tenho de dar continuidade ao meu trabalho físico, sentimental e espiritual. Os londrinos me esperam...

Com amargo,

Morte – que tudo sabe, que tudo destrói, que trás dor.

Um comentário:

@candido_dan disse...

Hum...é preciso "viajar" para tentar entender o que está escrito...mas nem assim se tem a garantia do entendimento.

"Navegar é preciso..."

:)