quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Eulália III (o inicio das relações)

Eu disse que não gostava das festas da cidade. Eu não queria ser reconhecida por aqui, nem tampouco pelos jornais do pais. Preferia viver em um convento às custas de alguma Irmã. Ou, quem sabe, morar no exterior e tornar-me uma outra pessoa longe dos insanos daqui. Eu me sentiria feliz ao lado de algum poeta ou um estudioso das relações humanas. Os meus pais me apresentaram ao Fausto, que de poeta não tem nada, ou ainda irei descobrir, e de relações humanas muito menos.

Fausto tem cabelos lisos chegando aos ombros. Seus olhos recheados com cor de mel, traduz-se em mistério, simplicidade e beleza. É bonito, claro. Porém, nem todo corpo bonito ou olhos bonitos mostra o que realmente é. Filho do Sr. Bernardo e Srª Lucrecia, ele administra junto ao pai a fazenda Três Leões, uma das mais valiosas da região. Estudou com um professor particular e poeta da cidade grande. Todas as segundas, quartas e sextas-feiras o professor vinha até Três Leões e ensinava ao menino.

Fausto não queria estudar. Queria cuidar do gado, das plantações, brincar com os meninos da cidade. Uma delas ajudava-o a carregar cestas com verduras e frutas. Ele tinha 16 anos, ela, 10. Eulália era sua melhor amiga. Sua companheira de aventuras. Filha de uma escrava alforriada e um italiano imigrante. Doce e aventureira, acompanhava os meninos em caças pela fazenda e a noite gostava de contar histórias sobre sua família de negro-africanos.

Estamos nos conhecendo e conversando sobre o que há de mais interessante nessa vida. Tudo que ele me fala é sobre a fazenda e Eulália. Diz-se encantado com a menina, que hoje tem 17 anos. Dos dezessete anos para os 23, ela tem muito o que aprender. Inclusive, a morrer, apagar-se da nossa vida. Gosto da ingenuidade dela e, se não a for, gosto mesmo assim. Quero aprender a bordar os vestidos e a menina sabe bem como desenhar com as linhas.

Quero culpa-la por tudo de mal que venha acontecer. Ao menos, acusa-la com provas. E, se o Fausto for realmente o homem da minha vida, deverei afastar Eulália dele. Porque nenhuma mulher admite ter o seu guardião nos braços de outra qualquer. Porque sou o que sou. Minhas COISAS não pertencem a ninguém. E estarei na minha casa. Mandarei em tudo. Farei com que o Fausto ajoelhe-se diante de mim, e peça-me a graça. Farei ele comer o pão que o diabo amassou. Farei da menina uma “escrava” dos espíritos de Santa Velha.

Estou no começo de um novo caminho. O primeiro passo é ter Eulália do meu lado. O segundo e mais delicioso, acabar, destruí-la gradualmente.

Que venha Eulália!

“Escarra nessa boca que te beija!” – A. dos Anjos