domingo, 15 de junho de 2008

[ alguém que se esconde n'outro alguém ]

Cansaçópolis, 10 de junho de 2016

Olá, Mariano!

Nada mudou em todos estes anos. Eu continuo com os cabelos pretos e curtos até os ombros. O trabalho continua me cansando, e suas cartas ainda estão guardadas embaixo do colchão. Hoje, dorme um outro homem nesta cama que um dia nós transamos e geramos o Mateus. É, neste ponto posso dizer que minha vida mudou.

O Ângelo trabalha em um laboratório de química de uma fábrica de cosméticos. Estranho, não? Ele é um homem diferente do que você foi comigo. Ele é mais romântico, mais carinhoso, mais charmoso, mais HOMEM. Não que você não tenha sido um pouco disso tudo. Porém, ele torna-se um ser humano diferente justamente porque eu o fiz ficar assim. Ele não é de falar muito. Apenas quando me deito na cama, ou no sofá branco, ele chega perto de mim e põe aquela boca e respiração nas minhas orelhas.

Há três semanas eu descobri uma coisa grave: o Ângelo tem o poder de sumir de repente. Sem contar com as mensagens que eu envio para ele no celular, e não obtenho respostas instantâneas. A última mensagem que mandei foi a seguinte: “Meu amor, eu sei que estás tão longe de mim no espaço, mas não no coração. É bom poder sentir que nada foi em vão. Beijos carinhosos de sua mulher que tanto o estima.” Fui muito profunda, Mariano? Acho que não. Você sabe bem que sempre agi dessa forma ‘piegas de ser’.

Antes de ontem comprei um computador novo, e ontem a noite comecei a escrever o meu “livro de cartas”. Penso em publicá-lo em breve. Lembra que eu te falei uma vez que eu ainda iria escrever um livro? Você esnobava de mim. Pois é, aqui estou escrevendo mais uma carta para a minha obra literária!

Agora tudo mudou, Mariano. Sinto neste exato momento que tudo mudou. Acho que não quero prosseguir uma carta para alguém que me deixou. Tenho certeza que não vou receber respostas suas. Seria melhor eu continuar aqui com o meu Ângelo carinhoso, romântico, não-respondedor de mensagens, do que com você? Ajude-me! Que horrível!
Olha, olha, olha! O Mateus acabou de chegar da escolinha, e preciso ajudá-lo a descarregar sua mochila. Hehehe... Ele vai perguntar o porquê de minhas lágrimas. Nosso filho entende bem quando derramo minhas tristezas... Ele está tão lindo, Mariano! O Ângelo sempre diz: “meninão! Você está cada vez mais parecido com o seu pai!”

Sinto saudades suas. Sinto falta do seu beijo quente. Sinto falta dos seus braços me apertando. Sinto saudades do meu gozo no seu corpo. Àquela fúria de desejos debatendo-se uns contra os outras. Ainda costumo dormir apenas de calcinha e sutiã esperando por você. Ainda deixo a janela do quarto aberta. O Ângelo nem liga, só acha engraçado, sabe? Mas não fala nada de mais.

Um beijo forte, tão mais forte quanto o último!
Guilhermina

PS: se por acaso vier, pode entrar e me tomar, tornar, tomar, tentar o seu corpo no meu.

4 comentários:

uashiashi disse...

Que lindo! Que gostoso de ler! É bem o tipo de texto que me agrada. Essa história em específico acabou me trazendo um sentimento de identificação. Enfim, como você já deve saber, você tem talento. Continue escrevendo e deixando seu dom fluir. É um presente para o mundo, não tenha dúvidas disso.

Beijos da sua fã.

Aline Romero disse...

Senti um queê de "ainda te espero, vem pra mim?" nessa carta... Lindo!
Um tanto quanto triste, um tanto quanto nostálgico, um tanto quanto frustrado. E igualmente belo.
A tristeza pode ser linda... Ainda mais quando é tristeza de amor!
belo texto. Espero que volte logo. Talvez tenha ido à um planeta mais próximo que Plutão!
Abraços!

Anônimo disse...

Olha... Eu fiquei impressionado com esse texto. Ele foi o melhor dos seus textos que já li. Uma perfeição de detalhes, sentimentos, fatos, desejos.

Você fez do incompreensível algo perfeito, avassalador... E soube ser digno de mérito no uso das expressões e palavras "ousadas".

Parabéns, sempre!

Anônimo disse...

Eriiiiick xD
Suas cartas. As melhores.
Que saudade de estar por aqui, de comentar, de sentir o que sinto com as coisas que você escreve..
Cada dia melhor, sem dúvida. Adoro quando se "eu lírico" é feminimo, muito.
"PS: se por acaso vier, pode entrar e me tomar, tornar, tomar, tentar o seu corpo no meu."
Simplesmente perfeitooo!
Saudade de você, nobre.
Beijão, mein freund.
/Isadora