quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Para Orlando

Espoo - Finlândia, 07 de agosto de 2009

Recolho-me nesta noite em minha casa de campo. São exatamente 21h50 do dia 07. Hoje, fez-se dez anos o falecimento do meu marido e do meu filho. Olho para a lareira acesa no quarto, onde outrora, nós três permanecíamos atentos a cada grito de graveto. Quando pegávamos o nosso vinho italiano, e bebíamos demasiadamente por horas ao ouvir canções de David Gilmour.

Em cima da mesa, descansa Orlando. Quem me faz chorar como uma criança quando é ferida por um pai ou uma mãe que não dá um tão sonhado brinquedo. Descansa olhando-me masculinamente como uma mulher. E eu, eterna de dores, respiro lentamente as palavras desenhadas em seu corpo límpido. Há, entre nós, cenas de felicidade mútua e duradoura. Corre, entre nós, a chama do desejo em trazer aqueles dois homens para o meu leito sangrio.

Os poros em meu rosto de boneca “anos 20”, como ele dizia, parecem entregar-se ao mau tempo. Ao tempo composto de ondas revoltas, ventos fortes, e frio poderoso de amargura. Eu falo das lágrimas agora correntes em meu rosto. Falo delas. Cansam a alma, cansam todo o meu corpo. Porque a dor sobre saiu mais resistente de mim. A dor grita clara e altamente em bom som.

Beira Das incertezas.

E mesmo buscando em você, Orlando, eu sinto cada sílaba dos teus textos na minha mente gritante de refúgio. Mesmo vivendo com você todos esses anos brancos, eu sinto, agora, incertezas que talvez não consigam se curar. Vejo apenas as minhas linhas. Linhas ora corrompidas de exaustão. Linhas e parágrafos e versos e metáforas e poesias devastadoras do nosso amor doentio e belo. Paradoxalmente feito.

Na cama, aqui bem do meu lado, a girafinha do nosso querido doce, olha-me sentindo a falta do alguém. Puxo o cobertor. Puxo um pouco mais as minhas meias. Olho fixamente o desenhar de tuas letras, de tuas declarações de amor, de tuas declarações infantis e penosas. (basta!)

Já, e tão grandiosamente já, sinto que estou prestes a entregar-me a outro. Porque de nada adianta eu viver aqui. De nada adianta eu olhar para a janela à minha frente e ver a dança dos pássaros, ou, quem sabe, o único olhar daquele anjo. Não adianta assistir passivamente os aplausos para os teus gestos heróicos de homem puro dando margem a um OUTRO LUGAR.

E à nossa criança, que sinto muito por sua morte, tenho a sensação de que somente ela irá me levar ao mar, à água além-mar. Ao sofrimento constante. Ao paradoxo. Ao lugar, não sei onde, de paz. Ao cais.

Vanessa

4 comentários:

Vanessa Cristina disse...

E o nome dela era Vanessa.

Gostei dela :]


Que bom que você voltou, meu nobre querido. Espero que, agora, não haja mais lugar para ausências.


Beijo grande.
:*

Anônimo disse...

orlando me lembra o homem mulher de virginia.

Arthur Dantas disse...

rs. não se preocupe, não farei nada do que foi dito, me falta força! e quanto a saber o gosto de voar, espero sentado, espero ansiosamente o medo do tempo passar e eu finalmente descobrir o gosto de um bater de asas.

Arthur Dantas disse...

ahh! e parabéns pelo texto, é realmente muito bom.